Sucessão Internacional de Ativos Digitais: Como Proteger e Transferir Criptoativos, Licenças e Contas Virtuais no Planejamento Patrimonial Global

Sucessão Internacional de Ativos Digitais: Como Proteger e Transferir Criptoativos, Licenças e Contas Virtuais no Planejamento Patrimonial Global

O conceito de patrimônio mudou. Se antes era sinônimo de imóveis, ações e contas bancárias, hoje inclui ativos digitais de alto valor econômico e simbólico: criptomoedas, obras de arte NFT, contas em plataformas de investimento online, royalties de marketplace e até licenças de software e contas premium de serviços digitais.

Em um contexto global, como garantir a sucessão ordenada e legal desses ativos, muitas vezes armazenados em carteiras digitais ou servidores internacionais, sem comprometer a privacidade e sem expor o patrimônio familiar?

Este artigo explora as melhores práticas de Planejamento Patrimonial e Sucessório Internacional (PPPI) para a proteção e transmissão de ativos digitais — um tema cotidiano, urgente e ainda pouco explorado no Brasil.


1. Ativos Digitais: O Novo Patrimônio Global

1.1. O que são ativos digitais patrimoniais?

Ativos digitais vão muito além de criptomoedas. Incluem:

  • Bitcoin, Ethereum e stablecoins

  • NFTs de arte, música ou objetos de coleção

  • Contas remuneradas em corretoras estrangeiras

  • Direitos autorais de ebooks ou cursos online

  • Participações em startups tokenizadas

  • Licenças vitalícias de softwares ou marketplaces

Todos esses bens têm valor econômico real e transmissível, ainda que muitas legislações tradicionais não os classifiquem claramente.


2. Os Riscos de Não Planejar a Sucessão de Ativos Digitais

2.1. Perda definitiva de acesso

Sem planejamento adequado:

  • Senhas se perdem

  • Frases-semente de carteiras cripto não são recuperáveis

  • Contas e investimentos digitais ficam inatingíveis aos herdeiros

Isso já ocorre com frequência em casos de falecimento sem sucessão planejada, resultando em ativos digitais congelados ou perdidos para sempre.

2.2. Inventário judicial moroso e vulnerável

Ativos digitais, especialmente criptomoedas, são muitas vezes invisíveis em inventários tradicionais. E mesmo quando declarados:

  • Há dificuldade de precificação

  • Tribunais locais desconhecem regulamentação específica

  • Riscos de bitributação ou bloqueio fiscal surgem em diferentes jurisdições


3. Ferramentas de PPPI para Ativos Digitais

3.1. Testamento digital com reconhecimento internacional

É possível criar testamentos digitais nos moldes reconhecidos pela Convenção de Haia de 1961, incluindo:

  • Lista criptografada de ativos e acessos

  • Senhas armazenadas em cofres digitais

  • Determinação de herdeiros específicos para ativos digitais

Esse testamento deve ser registrado em cartório e, idealmente, apostilado para validade internacional.

3.2. Cofres digitais sucessórios

Serviços como Safe Haven, Casa ou Ledger Vault permitem que titulares armazenem:

  • Seed phrases de carteiras de criptoativos

  • Certificados de NFTs

  • Licenças e contratos digitais

Esses cofres podem ser configurados para liberação programada a herdeiros ou advogados em caso de falecimento.

3.3. Uso de Trusts internacionais para ativos digitais

Trusts modernos podem abrigar:

  • Ativos digitais

  • Participações tokenizadas

  • Direitos autorais digitais

Vantagem:
Evita inventários em múltiplos países, preserva privacidade e permite gestão profissionalizada após a morte do instituidor.

Países como Jersey, Cayman e Cingapura são referências para Trusts digitais com proteção jurídica robusta.


4. Tributação Internacional de Ativos Digitais na Sucessão

4.1. Incerteza regulatória e risco fiscal

Países divergem quanto:

  • À incidência de ITCMD/Inheritance Tax sobre criptoativos

  • À declaração obrigatória desses bens em inventários

No Brasil:

  • Estados exigem ITCMD sobre “quaisquer bens e direitos”

  • Falta de previsão específica para ativos digitais gera margem para contestações judiciais

No exterior:

  • EUA: tributação federal sobre herança acima de USD 13,61 milhões (2024)

  • Portugal: atualmente isento para heranças entre familiares diretos

  • Japão e França: tributação elevada sobre patrimônio digital herdado

Solução:
Antecipar a doação ou transferir ativos para veículos patrimoniais antes do falecimento.

4.2. Precificação e declaração internacional

O planejamento precisa incluir:

  • Laudos de avaliação digital

  • Planilhas de custódia em multiwallets

  • Cálculo de imposto devido nos países envolvidos

Importante:
Ativos em exchanges estrangeiras devem ser informados na declaração brasileira de bens no exterior (DCBE) e no Imposto de Renda de Pessoa Física (IRPF).


5. Check-list PPPI para Ativos Digitais

✅ Mapeamento de ativos e localização das carteiras
✅ Definição de herdeiros e beneficiários para cada ativo
✅ Testamento digital registrado e apostilado
✅ Uso de cofres digitais para armazenar acessos
✅ Estruturação de Trusts ou holdings para grandes volumes
✅ Declaração fiscal atualizada em todos os países de vínculo
✅ Previsão no inventário ou contrato de partilha sobre a destinação de ativos digitais


Conclusão

Se antes os ativos digitais eram vistos como “dinheiro de risco”, hoje compõem parte importante do patrimônio de famílias e investidores globais. Ignorar sua existência em planejamentos sucessórios pode gerar perdas irreparáveis e insegurança jurídica para herdeiros e cônjuges.

Um Planejamento Patrimonial e Sucessório Internacional moderno e completo deve incluir:

  • Mapas patrimoniais digitais

  • Soluções de custódia de acessos

  • Definição prévia de herdeiros digitais

  • Estruturas internacionais que facilitem a sucessão sem burocracia

Como já ocorreu com imóveis e empresas globais, o patrimônio digital merece ser planejado com o mesmo zelo, eficiência tributária e segurança jurídica.

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Foto de Jardson Barros

Jardson Barros

Jardson Barros é um advogado de destaque e sênior responsável pela gestão de atendimento ao cliente no escritório Leonardo Lacerda Advocacia Internacional. Com uma sólida formação acadêmica e um perfil que une competências técnicas e gerenciais, desempenha um papel central no desenvolvimento estratégico do escritório, oferecendo soluções jurídicas inovadoras e adaptadas às complexidades do ambiente tributário global.

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